segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Miguel pede passagem

 

"Quem é coxo, parte cedo”, já dizia Ulysses Guimarães, o Senhor Diretas, estadista que inaugurou a nova ordem democrática no Brasil com a Constituição de 88, após 21 anos de ditadura militar. Valente, conciliador, nacionalista convicto, Ulysses participou de todas as campanhas pelo retorno do País à democracia, inclusive liderou a luta pela anistia ampla, geral e irrestrita. Com o fim do bipartidarismo em 1979, o MDB converteu-se em Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), do qual virou presidente nacional vitalício.

Com as sandálias da humildade, um jovem de 30 anos, representante da nova geração aguerrida do clã Coelho, remanescente das terras secas euclidianas, simbolizadas pelas caras assustadoras saídas das mãos de Ana das Carrancas, botou os pés no Recife, sábado passado, para assinar a ficha do DEM, apresentando-se assim: “Muito prazer, Pernambuco! Sou Miguel Coelho, prefeito de Petrolina”. Seu gesto franciscano foi aplaudido por uma plateia de quase mil pessoas, que foi ao delírio.

Na linguagem convencional, Miguel foi ovacionado. As palmas e os gritos partiram de caras velhas e novas da política estadual, de partidos das mais diferentes cepas ideológicas, do DEM, sua nova legenda, ao PSB, incluindo o PSDB, que tenta também criar uma candidatura de oposição ao Palácio do Campo das Princesas com a prefeita de Caruaru, Raquel Lyra. O barulho ensurdecedor da plateia dava a sensação de uma resposta assim em couro: “Seja, bem-vindo! Pernambuco precisa de ti, Miguel.”

O cenário armado para a filiação e, ao mesmo tempo, o pré-lançamento da candidatura de Miguel ao Palácio do Campo das Princesas lembraram as convenções americanas e os lendários atos do ex-governador Eduardo Campos. Aliás, tão visionário quanto ousado como Eduardo, Miguel quer Pernambuco lhe dando oportunidade para mostrar a ilha de exceção de gestão que transformou a sua Petrolina.

Quando sonhou com o Planalto, Eduardo também pediu para apresentar sua vitrine ao País. Eduardo foi ulyssista, partiu cedo, mas foi impedido de sonhar por uma fatalidade que lhe roubou a vida. Miguel também adotou a filosofia Ulysses Guimarães. É coxo, porque sua obra só ganhou vitrine até agora no Sertão. Para torná-la ampla, geral e massificada, tem que calçar botas de sete léguas para percorrer, além do seu Sertão, o Agreste, a Zona da Mata e a Região Metropolitana. Dos três pré-candidatos da oposição, Miguel é o que tem o maior acervo de obras e projetos estruturadores como cartão de apresentação ao grosso do eleitorado concentrado na Região Metropolitana do Recife, onde ainda é uma cara estranha. Daí, a humildade de se apresentar pedindo passagem para seu bloco desfilar na avenida.

Muito prestigiado – Segundo os organizadores do ato pró-Miguel, 34 prefeitos foram bater palmas para ele, sendo quatro de outros estados. Os 500 lugares reservados foram todos ocupados e muita gente ficou em pé. Contou ainda com lideranças de nove siglas: DEM, MDB, PSB, PSL, PP, Podemos, Avante, PSDB e PV. Entre os principais nomes, o presidente nacional do Democratas, ACM Neto, o vice-presidente do PSL, Antônio Rueda; o presidente estadual do DEM, Mendonça Filho, os prefeitos de Florianópolis, Gean Loureiro, de Salvador, Bruno Reis (ambos do DEM); e de Campina Grande, Bruno Cunha Lima (PSD).

O palanque nacional – Nos discursos celebrando o ingresso de Miguel ao DEM e seu start rumo ao Palácio das Princesas, ninguém associou seu palanque estadual ao nacional. Mas se o PSD, de Kassab, se entender com o DEM e o PSL, que virarão um único partido com a fusão prevista para o próximo dia 5, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) tem chances de se transformar no candidato apoiado por Miguel em Pernambuco, constituindo, assim, de fato e de direito a chamada terceira via.

Ameaça ao PSB – Caso o PSD de Kassab marche junto com Rodrigo, o PP tanto pode se agregar a essa frente quanto ficar com Bolsonaro. Caso adira a Pacheco, em Pernambuco Miguel passa a ser o candidato com mais chances de provocar uma fissura na Frente Popular, atraindo o grupo do deputado federal Eduardo da Fonte, presidente estadual da legenda. Miguel passa a ser, portanto, o postulante da oposição mais temido pelo PSB, muito mais que Raquel e Anderson, que não teriam esse guarda-chuva nacional.

Três de olho no TCU – Atual líder do Governo Bolsonaro no Senado, Fernando Bezerra Coelho está cotado, sim, para a vaga que será aberta no Tribunal de Contas da União com o pedido antecipado de aposentadoria do ministro Raimundo Carreiro. A vaga é da cota do Senado, não tem interferência do presidente Bolsonaro, mas Fernando tem concorrentes: o senador mineiro Antônio Anastasia (PSDB) e a senadora Lúcia Vânia, do MDB de Goiás. A antecipação da aposentadoria de Carreiro depende de um gesto de Bolsonaro: convocá-lo para assumir uma embaixada no Exterior.

Fica no DEM – Uma das principais lideranças do DEM no Estado, a deputada Priscila Krause tem uma relação melhor e mais estreita com Raquel Lyra, até porque foi apoiada pela prefeita tucana nas eleições passadas. Com o sepultamento das coligações pelo Senado, o melhor caminho para Priscila renovar o seu mandato na Alepe é o DEM. Até porque uma candidatura própria a governador, como a de Miguel, além de facilitar a montagem da chapa proporcional, não será obra do partido, mas da fusão com o PSL. Custaria um preço caro para a deputada se rebelar apenas porque teria uns votinhos colada a Raquel. Candidata a governadora, a tucana, vale a ressalva, não poderá ter candidato preferencial ao parlamento.

CURTAS

ORGULHO – Do presidente nacional do DEM e ex-prefeito de Salvador, ACM Neto, em discurso no ato de sábado passado: "Petrolina consagrou a primeira gestão de Miguel. Um gestor público que nos orgulha. Muito mais que qualquer palavra que eu possa falar neste encontro, o reconhecimento do seu povo o qualifica para seguir uma nova jornada na sua nova vida pública."

ENGAJAMENTO – De Mendonça Filho em seu discurso: “A gente tem muita fé de que Miguel vai tocar o coração do povo, apresentar boas ideias, propostas, num diálogo aberto para que a gente possa mudar Pernambuco. A gente vai ajudar onde quer que a gente esteja, no Agreste, na Mata, no Sertão ou mesmo aqui na capital e Região Metropolitana.”

Perguntar não ofende: Depois de Miguel, quem dirá que é candidato a governador em ato formal: Raquel ou Anderson?

Fonte: Blog do Magno Martins.

Nenhum comentário:

Postar um comentário