Foto: Isac Nobrega |
Replicando o discurso de caráter eleitoral do presidente Jair Bolsonaro (PL), o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o governo pretende reduzir não apenas os impostos federais sobre combustíveis, mas também retomar a discussão sobre a diminuição do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Na avaliação de Guedes, essa será uma forma de distribuição do "aumento estrutural" da arrecadação federal, que bateu recorde em 2021, além de compensar o atraso da reforma tributária. A declaração gerou preocupação entre especialistas em contas públicas, que alertam para a falta de espaço fiscal para a medida.
Pelos cálculos do ministro, em valores nominais, "a arrecadação subiu quase R$ 300 bilhões no ano passado, sendo mais de R$ 100 bilhões em caráter permanente". "O aumento da arrecadação estrutural não vai ficar nas mãos de um Estado obeso. Vai beneficiar o consumidor. O Brasil vai ser uma economia de mercado, com consumo de massa", disse Guedes, em evento virtual do Credit Suisse.
O ministro cogitou a redução do IPI sobre vários produtos, como fogões, geladeiras e máquinas de lavar, a fim de beneficiar "os mais frágeis". Mas não deu detalhes da medida. Em tom eleitoreiro, disse, ainda, que é preciso "dar continuidade ao processo de transição" da política econômica prometida no início do governo.
A PEC dos Combustíveis vem gerando polêmica, porque pode ter um impacto fiscal de R$ 70 bilhões — ou de R$ 200 bilhões se houver adesão dos estados para a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Guedes demonstrou ser favorável apenas à redução dos tributos sobre o diesel, que representam, hoje, uma receita de R$ 17 bilhões a R$ 18 bilhões por ano. O ministro criticou subsídios à gasolina e descartou a ideia de criação de um fundo de estabilização dos preços na bomba, previsto na proposta original da PEC, porque o custo poderia chegar a R$ 120 bilhões por ano. "Isso é três vezes o valor do Bolsa Família. Tem muita gente circulando com ideias insensatas", disse.
O chefe da equipe econômica ainda minimizou problemas nas contas públicas, após o Banco Central ter reportado, nesta semana, superavit primário de R$ 64,7 bilhões para o setor público consolidado, que inclui governos federal e regionais e as estatais federais. O saldo positivo foi o primeiro desde 2013. Segundo ele, os pessimistas e os críticos das contas do governo são militantes e "desonestos intelectualmente".
Apesar dos resultados positivos em 2021, especialistas entendem que não há espaço fiscal para a redução de impostos. Juliana Damasceno, da Tendências Consultoria, vê a PEC dos Combustíveis como uma medida eleitoreira cara, que pode não surtir efeito no bolso do consumidor. Ela disse que o desconto previsto na bomba poderá nem ser repassado por conta da aceleração do preço do petróleo nos últimos dias e da defasagem com o mercado externo.
Na avaliação da economista, 2021 foi atípico. "A inflação elevada inflou a receita tributária, mas, neste ano, o salto não vai se repetir. Não há como prever um aumento estrutural de arrecadação como o ministro está falando. A economia está estagnada e não tem fôlego. E não podemos comemorar a inflação, que cobra seu preço a longo prazo", afirmou.
A arrecadação acima do previsto em 2021, segundo ela, ajudou a engordar o caixa da União e o colchão de liquidez recorde de R$ 1,18 trilhão para a gestão da dívida pública. Esse recurso não pode ser sacado facilmente para uma redução de tributos sem uma justificativa de impacto social relevante. "O governo deveria fazer uma avaliação das isenções fiscais que já existem antes de começar a reduzir imposto", disse.
Bernardo Motta, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), vai na mesma linha. "O cobertor é curto, afirmou. "A PEC poderá aumentar o rombo fiscal e o tiro, sair pela culatra, sem ter efeito no bolso do consumidor, além de piorar o cenário macroeconômico, pressionando o dólar, aumentando a inflação, e, consequentemente, o preço do combustível na bomba", alertou.
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