Após muitas especulações que permeiam o cotidiano de Brasília desde o ano passado, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vem colocando em prática o que, até o momento, pode ser definido como o movimento mais próximo de uma reforma administrativa em seu primeiro escalão, com mudanças confirmadas em três ministérios ao longo da última semana.
Na Casa Civil, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) saiu da corda bamba “caindo” em direção ao Ministério da Cidadania, abrindo espaço para mais um militar, o general de quatro estrelas responsável pela intervenção federal no Rio de Janeiro, em 2018, e chefe do Estado Maior do Exército, Walter Souza Braga Netto, que assume a pasta. Osmar Terra (MDB-RS), ex-ocupante da Cidadania, deixou a pasta e retomará seu mandato na Câmara dos Deputados. Enquanto o Ministério do Desenvolvimento Regional ganha o comando do ex-deputado pelo PSDB-RN, Rogério Marinho, substituto de Gustavo Canuto, realocado para a DATAPREV.
Apesar da quantidade de mudanças em meio a agenda reformista desejada pelo presidente, parlamentares ouvidos pela reportagem acreditam que as alterações não perturbam a rotina do congresso e, inclusive, impactam de forma positiva o andamento da pauta do governo. O próprio presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também não manifestou nenhum tipo de insatisfação e não questionou a mudança na Casa Civil, inclusive, definindo Braga Netto como “organizado, disciplinado e preparado” para ocupar o posto.
O vice-líder do Republicanos na Câmara, Silvio Costa Filho, avalia as alterações como importantes para acelerar a agenda reformista no Congresso. “Encaro que o governo fez uma movimentação que tende a ajudar o País. Acredito que, com essas mudanças, poderemos ter mais celeridade na agenda do desenvolvimento”, afirma Silvio. Dentre as alterações a mais bem-recebida foi a de Rogério Marinho, visto como um nome que pode aproximar o Planalto do Nordeste.
“Os deputados que têm votado matérias com o governo têm uma relação muito próxima com Rogério Marinho”, corrobora o vice-líder do Solidariedade na Casa, Augusto Coutinho, que, no entanto, pondera que a relação com o governo esbarra na própria forma de condução do Executivo. “É uma relação conflituosa e não vai deixar de ser. O governo conduz assim, não sei se por estratégia”.
Para Coutinho, contudo, a tendência de continuidade das reformas também se manifesta pela própria vontade da Casa. “O Congresso tem se mostrado reformista, o que é importante, existe necessidade real de se enfrentar essa questão, com a reforma tributária e a administrativa. Então, acho que não vai mudar esse entendimento para pior por conta das mudanças.”
No entendimento do líder do PSD na Câmara, André de Paula, a troca na Casa Civil "impacta pouco" a rotina dos parlamentares. "A Casa Civil não tinha mais a atribuição de fazer a articulação política do governo com a Câmara (desde junho de 2019). Se o ministro Onyx, que era parlamentar não tinha essa possibilidade, acredito que isso não vai mudar com a troca", considera.
A constatação é similar à de Coutinho. “A Casa Civil, por si só, já não vinha tendo protagonismo nessa relação, o governo já direcionava com o ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo)”, ressalta. Para Silvio Costa Filho, a mudança na Casa Civil consolida o caráter cada vez mais “institucional” da pasta. “O ministério passou a ser muito mais um órgão institucional da Presidência do que um ministério fim, como Cidadania, Educação e Desenvolvimento Regional”, avalia.
Reforço militar
As mudanças executadas por Bolsonaro emitem uma série de sinais por parte do Governo Federal, com algumas confirmações. A saída da Casa Civil evidencia a perda de prestígio de Onyx. Colocado na pasta, inicialmente, por conta da boa relação com os parlamentares, teve a atribuição de articulação política retirada das suas mãos ainda em junho do ano passado e dada para o general Luiz Eduardo Ramos, chefe da Secretaria de Governo.
A escolha por Braga Netto, por sua vez, fortalece a ala militar do governo, em detrimento da chamada ala “olavista”, composta por seguidores do escritor Olavo de Carvalho, da qual Onyx faz parte. Mais que isso, ela deixa as quatro pastas alocadas no Planalto ocupadas por ministros militares: o general da reserva do Exército Augusto Heleno, no Gabinete de Segurança Institucional; o major da reserva da PM do Distrito Federal, Jorge Oliveira, na Secretaria-Geral; além de Luiz Eduardo Ramos e Braga Netto.
Na última sexta, a “militarização” do Palácio do Planalto teve continuidade com a nomeação do almirante Flavio Augusto Viana Rocha, como chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), responsável, entre outras coisas, pelo assessoramento do presidente para assuntos internacionais. Nesse movimento, o assessor internacional de Bolsonaro, Felipe Martins, seguidor de Olavo de Carvalho, e cuja atuação desagradava os militares - por conta da postura abertamente pró-Israel e EUA que pode trazer problemas na política externa - perdeu atribuições, evidenciando o enfraquecimento da ala ideológica do governo. "Ficou completamente militarizado o meu terceiro andar. São quatro generais ministros agora. Nada contra os civis. Têm civis excepcionais trabalhando, como o Sergio Moro, por exemplo", afirmou Bolsonaro.
Na prática, a gangorra entre militares e olavistas está favorável aos primeiros, mas sem prenúncio de previsibilidade por parte do Executivo, uma vez que militares graduados já foram colocados para fora pelo presidente. “Na verdade, a indicação de um militar na Casa Civil, por exemplo, atende uma demanda das Forças Armadas, que queriam protagonismo no governo e se sentiam preteridas pelo núcleo de Olavo de Carvalho, desde a saída do general Santos Cruz (da Secretaria de Governo). Militares são muito pragmáticos nesse sentido”, explica o cientista político e professor da Faculdade Damas Antônio Lucena. Mesmo sendo substituído por outro militar, Santos Cruz saiu desgastado justamente por embates ideológicos com Olavo. Naquela ocasião, os olavistas saíram “vitoriosos”.
“Há quem enxergue isso inclusive como uma diminuição do viés ideológico de radical de direita. O militar é mais disciplinado, mais objetivo, isso talvez minimize o viés ideológico”, diz Coutinho.
A retirada do único civil do círculo mais próximo do presidente Bolsonaro, no Palácio do Planalto, também tem um significado para Lucena. “Em certa medida, mostra que ele quer ter maior controle. Bolsonaro não tem traquejo político, sempre foi parlamentar do baixo clero, não participava dos grandes debates entre os parlamentares”, opina o professor, destacando que como qualquer mudança do primeiro escalão, esta também terá consequências na relação com o Congresso, neste caso, deve significar a manutenção da dependência exacerbada do Centrão e de suas lideranças. “Na formação desse novo núcleo de confiança, particularmente, tenho a impressão que ele dificilmente terá o número de pessoas necessárias para, por exemplo, se livrar da dependência do Centrão”, resume Lucena.
Nordeste
No Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho chegou com o discurso construído para o cenário que se apresenta: “construir pontes”. A troca foi vista como um aceno positivo ao parlamento, já que haviam queixas recorrentes ao ex-ministro Gustavo Canuto, tanto relativas para marcar reuniões, como para acelerar a liberação de emendas. Nos bastidores ele é definido por parlamentares como alguém “sisudo” e “fechado”.
Já Marinho chega com a credencial de ter sido um dos principais articuladores da reforma da Previdência na Câmara e no Senado, enquanto ocupava o posto de secretário especial do Ministério da Economia. Ao longo do processo pavimentou uma boa relação com os parlamentares, sendo visto como um nome facilitador para as demandas direcionadas ao Desenvolvimento Regional. Para André de Paula, a escolha por Marinho é um “fato a ser comemorado”.
“Rogério Marinho facilita muito, é um deputado de muitos mandatos, um nordestino, teve um papel determinante, fundamental na construção política que resultou na reforma da previdência, respeitado inclusive pela oposição”, sinaliza, ressaltando que o ex-deputado ocupa um espaço que carecia de protagonismo. “A partir do momento que ele escolhe Rogério Marinho, ele sinaliza que quer uma mudança no trato com os deputados. Eu vejo com bons olhos essas movimentações promovidas pelo presidente”, corrobora o deputado Fernando Rodolfo (PR).
A atenção do ministro ao Nordeste teve início em encontro na quarta-feira passada, na residência oficial de Rodrigo Maia, onde o deputado Raul Henry (MDB) fez uma apresentação com diagnóstico sobre a região.
Fonte: Blog da Folha de PE.
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