Em depoimento à Polícia Federal, onde ficou durante 2h30, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) confirmou ter se reunido com o senador Marcos do Val (Podemos-ES) e com o ex-deputado federal Daniel Silveira, em 8 de dezembro do ano passado, mas negou ter aventado planos de gravar o ministro Alexandre de Moraes ou tratado qualquer iniciativa fora das “quatro linhas da Constituição”. Bolsonaro prestou depoimento em investigação da PF sobre declarações de Do Val em entrevistas e lives acerca de uma trama contra Moraes.
Esta é a quarta oitiva de Bolsonaro na PF este ano. O Metrópoles teve acesso ao depoimento em que o ex-presidente diz que a reunião com Do Val durou cerca de 20 minutos e foi convocada por Daniel Silveira.
No documento, Bolsonaro afirma ainda que o encontro não tratou de assuntos “não republicanos”, tampouco algum plano “Tabajara” contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
O processo no qual Bolsonaro foi intimado a prestar esclarecimentos à PF apura suposto plano para gravar, clandestinamente, Moraes, em tentativa de reverter a derrota do ex-presidente nas últimas eleições. Na condição de testemunha, Bolsonaro respondeu a todas as perguntas sobre as declarações de Marcos do Val.
Logo após a oitiva, Bolsonaro falou à imprensa e confirmou o que disse à PF. Ele revelou que, “dia 9 ou 10 de dezembro, logo após aquela reunião comigo e Marcos do Val, eu respondi para ele: ‘coisa de maluco’. Eu não tinha vínculo com sr. Marcos do Val. Nada foi tratado. Não tinha nenhum plano para gravar o ministro Alexandre de Moraes”, disse.
O ex-presidente também destacou que Do Val quis demonstrar algum grau de amizade com Moraes. “Tudo começou por aí. Houve o contato de Daniel Silveira, que Do Val queria falar comigo assunto importante. O Daniel Silveira queria que o Marcos do Val falasse alguma coisa, mas ele não falou nada. Não sei qual foi o contato do Daniel com o Do Val. O que eu tinha de conhecimento é que eles não tinham relacionamento”, acrescentou.
Bolsonaro confirmou que a reunião com Silveira e Do Val foi no Palácio da Alvorada. E disse que o ministro Alexandre de Moraes jamais foi citado.
O ex-presidente deu a entender que as questões relacionadas com Do Val não devem ser levadas a sério. “Não vou falar se ele inventou. Foi levado ao Alvorada pelo Daniel Silveira porque disse que queria conversar comigo”, acrescentou.
Bolsonaro comentou sobre a quantidade de depoimentos dados à PF e que poderão acontecer mais, citando a busca e apreensão em sua casa, na situação relacionada com os cartões de vacina. “É um ato de esculacho. Fizeram até busca e apreensão na minha casa”, disse.
Contradições de Marcos do Val
Inicialmente, Marcos do Val disse, nas redes sociais: “[houve uma] tentativa de Bolsonaro de me coagir para que eu pudesse dar um golpe de Estado junto a ele”. Depois, o senador mudou a versão e declarou que o ex-presidente teria ficado calado durante toda a reunião que os dois tiveram. Nessa versão, o parlamentar responsabilizou o ex-deputado Daniel Silveira pelo plano e garantiu que denunciou tudo ao ministro Alexandre de Moraes.
Na manhã desta quarta-feira (12/7), o senador negou envolvimento com qualquer plano golpista e afirmou ter “apreço pela democracia”. O pronunciamento ocorreu após a coluna de Rodrigo Rangel, do Metrópoles, revelar trocas de mensagens em que Do Val detalha o passo a passo de uma suposta trama golpista, alinhada com Bolsonaro e Silveira (entenda mais abaixo).
Em junho, Moraes autorizou uma operação de busca e apreensão contra o senador. As buscas ocorreram no apartamento funcional do congressista em Brasília, no gabinete dele, no Senado, e em um endereço no Espírito Santo.
As medidas foram solicitadas depois de os investigadores identificarem tentativas do senador de atrapalhar as apurações sobre os atos golpistas do dia 8 de janeiro. No fim de junho, o senador solicitou afastamento das atividades parlamentares após precisar de atendimento médico durante uma sessão da CPI que investiga os ataques de 8 de janeiro.
Quarto depoimento
Esta foi a quarta vez que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) depôs na sede da Polícia Federal, em Brasília, em 2023. Em 5 de abril, o ex-mandatário foi à sede da corporação para prestar esclarecimentos sobre as joias que ganhou de presente da Arábia Saudita.
Em 26 de abril, o ex-presidente depôs no âmbito do Inquérito (INQ) nº 4.921, que investiga incitadores dos atos de 8 de janeiro. Ele virou alvo das investigações após compartilhar, em 10 de janeiro, publicação em que a regularidade das eleições era questionada. Apesar de Jair Bolsonaro ter apagado o post no mesmo dia, a PGR acusou o ex-presidente de incitar a perpetração de crimes contra o Estado de Direito ao propagar o vídeo.
Em maio, Bolsonaro deu sua versão à PF sobre as investigações que apuram fraude nos cartões de vacinação dele, da filha, de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência, e de pessoas próximas.
Trama antidemocrática
As mensagens encontradas pela Polícia Federal no telefone celular do senador e divulgadas pelo Metrópoles revelam o parlamentar fazendo um perigoso jogo duplo na cúpula dos Poderes da República em suposta trama para deflagrar um golpe de Estado destinado a anular as eleições presidenciais de 2022.
Ao mesmo tempo que falava com o próprio Bolsonaro e trocava mensagens com o ex-deputado Daniel Silveira para tratar do plano, que previa gravar o ministro Alexandre de Moraes e abrir caminho para o que seria uma intervenção militar no país, Do Val mantinha o próprio ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral a par de cada passo que dava.
De um lado, o senador tratava com Daniel Silveira e se reunia com Bolsonaro maquinando o plano para derrubar Alexandre e anular as eleições; de outro, ele delatava ao ministro, quase que em tempo real, que o então presidente da República e o deputado cassado estavam tentando cooptá-lo para colocar a proposta em marcha.
O plano que tinha o senador como personagem central envolvia a tentativa de flagrar eventuais inconfidências do ministro sobre o processo eleitoral. O próprio Marcos do Val encontraria o ministro e, equipado com aparelhos de escuta, gravaria o diálogo. O teor da gravação, de acordo com plano mirabolante gestado nas hostes bolsonaristas, seria a base para que militares alinhados ao bolsonarismo anulassem a eleição, decretassem uma intervenção no país e evitassem a posse de Lula.
Fonte: Portal Metrópoles.
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