Os estados e municípios brasileiros acumulavam no final de 2020 dívidas judiciais relacionadas a precatórios de R$ 143,5 bilhões, segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Algumas delas estão em situação de inadimplência há mais de uma década.
O valor devido e não pago pode se multiplicar nos próximos anos caso seja aprovado pelo Congresso o calote previsto na PEC dos Precatórios, que permite à União e aos demais governos hoje adimplentes postergar esses pagamentos.
Os números do Mapa Anual dos Precatórios do CNJ mostram um saldo de R$ 194,7 bilhões pendentes de pagamento em todas as esferas de governo, incluindo valores que deveriam ter sido pagos até aquele ano e aqueles expedidos para serem quitados a partir de 2021.
O mapa também mostra o valor de R$ 16,7 bilhões referentes à Justiça do Trabalho e R$ 12 bilhões ao INSS.
Há hoje dois regimes de pagamento. A União e outros entes adimplentes estão no regime geral, que prevê que precatórios expedidos pelos presidentes de tribunais até 1º de julho de um ano devam ser pagos no exercício seguinte.
Distrito Federal, 24 estados e 1.626 municípios estão, desde 2009, em um regime especial, que vem sendo prorrogado e, atualmente, permite quitar as dívidas atrasadas até 2029. Apenas Espírito Santo e Alagoas não estavam na lista de estados devedores.
Segundo o CNJ, a dívida do regime especial somava R$ 91 bilhões nos estados e R$ 52,5 bilhões nos municípios, uma inadimplência total de R$ 143,5 bilhões.
A PEC acrescentará a esse saldo pelo menos R$ 45 bilhões em 2022, que são os precatórios federais que não serão pagos no próximo ano, devido ao teto que será criado para quitar essas dívidas.
Do valor total no final de 2020, considerando dívidas atrasadas e aquelas dentro da programação de pagamento, R$ 91,3 bilhões estão na esfera estadual, sendo R$ 29,2 bilhões em São Paulo e R$ 15,6 bilhões no Rio Grande do Sul.
Há também R$ 60,2 bilhões na esfera municipal (R$ 19,5 bilhões somente na capital paulista) e R$ 43,2 bilhões na federal.
Precatórios são requisições de pagamento expedidas pelo Judiciário para cobrar de municípios, estados ou da União, assim como de autarquias e fundações, valores devidos após condenação judicial definitiva.
O pagamento está previsto na Constituição, mas o Congresso Nacional já fez diversas alterações no texto para postergar o recebimento dessas dívidas. O Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) lista pelo menos cinco moratórias desde 1988, incluindo o regime especial. A última delas pegou carona na PEC Emergencial, promulgada em março deste ano.
Eduardo Gouvêa, presidente da Comissão de Precatórios da OAB Nacional, afirma que muitos governantes trabalharam sistematicamente para que essas dívidas não fossem pagas. Ele prevê o aumento da inadimplência com a PEC.
“A prova de que precatório não é problema de dinheiro é que o estado e o município de São Paulo são os dois entes mais ricos na nação e os maiores devedores de precatórios, porque a vida inteira trabalharam para não pagar. Muitos municípios pequenos pagam absolutamente em dia. A capital do Rio de Janeiro também está em dia há décadas”, afirma Gouvêa.
“A PEC vai afetar indiscriminadamente União, estados e municípios”, afirma o também advogado José Luis Wagner, que atua na área e prevê o aumento da inadimplência entre todos os entes.
Dados do estado de São Paulo, maior devedor de precatórios do país, mostram um valor pendente acumulado de R$ 26,6 bilhões até agosto de 2021. Desse total, 77% se referem a precatórios alimentares, relativos a salários e benefícios previdenciários, por exemplo. No total, são 84,3 mil precatórios, sendo que quase 60 mil foram expedidos a partir de 2020 (98% deles alimentares). Há débitos anteriores a 2008.
Na capital paulista, de acordo com a Procuradoria-Geral do município, o estoque está em R$ 22 bilhões. Desde 2017, foram pagos mais de R$ 9,7 bilhões. Todas as pessoas acima de 60 anos ou que tenham deficiência ou doenças graves com precatórios expedidos até o orçamento de 2021 receberam integralmente ou parcialmente os valores. Programa para pagamentos à vista neste ano, com desconto de 25% a 40%, para quitar dívidas desde 2003, recebeu 2.403 propostas, sendo que já foram pagos quase R$ 800 milhões pelo Tribunal de Justiça.
O Rio Grande do Sul, terceiro maior devedor, estima um estoque de R$ 16,5 bilhões ao final deste ano, com previsão de pagamento de R$ 2,1 bilhões em 2022, mais da metade via compensação ou acordo com deságio. De acordo com o plano apresentado neste ano pelo governo gaúcho para tentar reduzir essa fila, nos últimos dois anos, o valor quitado superou as novas inscrições.
Eduardo Cucolo
São Paulo, SP
Jornal de Brasília.
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